Jornal A Notícia 100 anos
Neste dia 24 de fevereiro o jornal A Notícia, de Joinville, completaria um século de vida. Como sabemos, o jornal padece de lobotomia desde que foi eliminado do papel e transferido em coma profunda para o universo digital, o grande cemitério da mídia impressa em todo o planeta. E, no qual, foram sepultados, além de A Notícia, outros grandes jornais catarinenses – Santa, de Blumenau, Diário Catarinense, da Capital. Todos num mesmo dia maldito que é dever esquecer para sempre, assim como seus perversos autores.
Transferir para o digital é atestado de óbito para quase todos os jornais que, a exemplo de A Notícia, depois de tornados medíocres ao absoluto, continuam num padecimento que só o desprezo pela inteligência explica. O mundo da internet não é o mundo da inteligência, com raras exceções. Ao contrário, pululam e pipocam as mais grotescas experiências. A internet e o desvario da comunicação sem limites, que é a não-comunicação em estado puro, continua o grande enigma do século 21. Para o bem e para o mal, só o saberemos no futuro próximo.
Falemos de A Notícia, na qual operei por quase meio século, escrevendo impunemente por décadas, desde o ano de 1970 e, com raros intervalos, até o dia 13 de março de 2016, quando, coincidente, publiquei o último artigo – Adeus, querida – a expressão de Lula da Silva a Dilma Roussef, e não uma ‘despedida’ do jornal, a que não tive direito.
Fundado no dia 24 de fevereiro de 1923 pelo jornalista Aurino Soares, o jornal teve vida fulgurante até dezembro de 1944. Circulando numa cidade em que 75% da população se comunicava e se aculturava na língua alemã, e, mesmo assim, conseguiu uma performance inacreditável, pois, quando parou de circular em razão da morte repentina de seu fundador, no dia 17 de dezembro, A Notícia era o maior jornal entre São Paulo e Porto Alegre, onde, respectivamente, circulavam o ‘Estadão’ e o Correio do Povo, da Caldas Jr.
Escrevi dois livros sobre a história do jornal, aos 60 anos e aos 80, na gestão da família Thomazi e Falgatter. Depois de Aurino – 1923/1944 – a empresa teria novos proprietários. De 1946 a 1956, Aderbal Ramos da Silva e a família Alvim, comandaram a empresa. De 1956 em diante, um grupo de 150 empresários assumiu o controle, sob a liderança de três principais acionistas – Helmuth Falgatter, Baltazar Buschle e Wittich Freitag. No começo dos anos 80, Falgatter assumiria o controle e o genro, Moacir Thomazi, lideraria fulminante nova etapa na história do jornal, elevando-o à liderança na circulação e à condição de um dos mais modernos jornais do país, com impressão a frio e edições com até 70 páginas, com dezenas de cadernos especiais. Nesta etapa, além de outros importantes jornalistas, Luiz Meneghim liderou o rejuvenescimento do jornal que consolidou sua posição de número um do mercado.
Vendido à RBS em 2006, grupo gaúcho manteve o comando de A Notícia até transferir a empresa e o destino do jornal ao grupo NSC, estranhos ao mundo jornalístico e autores da extinção dos jornais catarinenses do universo impresso. Uma decisão que tem cobrado um preço trágico aos catarinenses, mantendo suas três mais importantes populações – Florianópolis, Joinville e Blumenau – com suas extensões metropolitanas, numa miséria intelectual e na orfandade política sem precedentes, cujas dramáticas repercussões terão que ser avaliadas nas próximas décadas.
Enfim, os 100 anos de A Notícia simbolizam o auge e a queda, não só de uma empresa, mas de toda a cidade de Joinville. Uma profecia: jornais impressos voltarão um dia. O homem se fez pela palavra e, depois da Bíblia, os jornais foram o alimento diário e inesgotável de cada dia nos últimos 300 anos. Por enquanto, estamos no exílio. Esperemos, não para sempre.