Cantão do Brasil
No site da `Folha` deste sábado, 18, matéria destaca dirigente de time de futebol de Nova Veneza que convive com comentários hostis à sua declarada posição de pessoa gay. Trata-se de sobrenome importante na comunidade de 13 mil habitantes, na maioria católicos e descendentes de italianos. A reportagem observa que, mesmo sendo pessoa influente e dedicada às causas da comunidade, desde que passou a dirigir o time as reações se fizeram ouvir de forma clara e aberta.
Tudo bem. A questão é essencialmente de um time de futebol amador, numa pequena cidade do sul catarinense. Acontece que na seção de `comentários` está lá, também, a opinião de leitor- `Santa Catarina tem se tornado um cantão de intolerância, ignorância e falta de civilidade`.
Observe-se ainda que Santa Catarina é o Estado `mais Bolsonarista do Brasil`, com inúmeros registros de fatos bem desabonadores como os crescentes registros de neonazistas espalhando ódio e até mesmo a demonstração explícita de simpatia ao nazismo em manifestação pública no Oeste do Estado. O fato acabou determinando a cassação do mandato de vereadora que revelou vídeo do caso nas redes sociais. Em peso, os vereadores masculinos da casa decidiram pela cassação da colega.
Agora, como se já não fosse pouco, noticia-se a estranha manifestação de deputado federal de Joinville no plenário da casa denunciando a compra de políticos pelo governo para impedir a constituição de CPMI, circula de tornozelão eletrônico e está proibido de dar entrevista. Dias depois, professor de Imbituba foi afastado da escola por fazer apologia do nazismo. Pela segunda vez em plena sala de aula. Na mesma semana, a notícia de que senador catarinense deu emprego de 9,5 mil de reais ao filho 04 do ex-presidente para o usufruto de cargo em Balneário Camboriú.
Somando tudo, mais as demonstrações explícitas de formidável apoio do eleitorado catarinense às teses da extrema direita, explica-se a avaliação que, de fato, somos o `cantão do Brasil`. A imagem é muito forte e está avassaladoramente distribuída por todo o país. Cantão do Brasil significa que nos transformamos em área de enorme potencial explosivo, de terra de ninguém e onde impera o machismo, a intolerância e o deboche. A causa principal disso tudo talvez venha da quase erradicação do jornalismo, da reflexão coletiva através da imprensa, do esvaziamento dos meios de comunicação, alcançando dramaticamente os valores indissociáveis à civilidade e o respeito pelo outro. Os níveis de ensino decaem perigosamente, do básico ao superior. Sim, é preciso avaliar quais os efeitos do fim dos jornais em Santa Catarina e da superficialidade vertiginosa em que afunda o universo da comunicação. Registre-se que não se trata de erosão apenas em SC. No pais inteiro acabamos nisso também, como podemos constatar na Globo, na Veja, no Estadão e na Folha de nossos dias. No sistema educacional a crise é ainda pior, onde grassa e viceja as falácias da ideologia, do radicalismo e da penúria mental dos personagens.
Porque nossa representação política pode baixar a nível tão grotesco? Como se pode aceitar o servilismo, a mediocridade e a ostensiva ausência de escrúpulo em relação à opinião do povo? Quando nos apontam como o cantão do Brasil, terra da intolerância e da ignorância, os brios de Santa Catarina precisam ser demonstrados. Por onde e de quem? Que instituições falam por todos e nos representam? Onde vamos acha-las neste mar de ausências e irrelevâncias? Na propaganda paga por todas e em todos os canais, dizendo que estão agindo na proteção do povo? Esse é o novo populismo, agora institucional, deslavado e desvairado. O cantão do Brasil deveria reagir. Já o Brasil, esperemos pela virada do milênio. (aternes@terra.com.br / apolinarioternes.com.br)