Em torno da palavra

Em tempo de pandemia, a palavra pode recuperar outros sentidos. Não a psicose coletiva da polarização política, mas o conteúdo forte do signo que nos identifica, ilumina e é capaz de resgatar a esperança. Certamente ciclos de tão radicais ‘cancelamentos’ revelam que a comunicação ingressou num período de plena esquizofrenia. Há comunicação em excesso, e compreensão de menos. Com tanta informação, onde ficou a sabedoria? Com tanta análise, onde ficou o entendimento? Com tantas versões, de que vale a certeza de ontem?

Depois de anos na imprensa diária, volto com a expectativa de contribuir. Talvez,

propor o diálogo, buscar o consenso, restabelecer fronteiras. Um pouco a cada dia, e não todos os dias. Valorizar os temas, avançar para além do cotidiano, para além da política, para o inesperado sentimento de liberdade, da fragilidade e da precariedade singela de tudo, ou de quase tudo. Lembro de Marcelo Gleiser e do pouco lido ‘A Simples beleza do Inesperado’, em que afirma: ‘se as escolhas que fazemos na vida fossem sempre fáceis e confortáveis, a vida seria sempre fácil e confortável’.

Precisamos menos de palavras e mais de silêncios. De menos opinião, e mais escuta. Principalmente de ‘escuta, filho’ , como escreve São Bento no início de suas Regras para os beneditinos.  Num mundo globalizado e cheio de uma peste silenciosa que retira milhares de vidas todos os dias em quase todos os cantos do mundo, acabamos reféns de uma imensa e única desesperança, desânimo e angústia. Mas, para além de tudo isso, é preciso olhar para o céu e aprender a oração milenar que nos acompanhar desde o dia em que, inesperadamente, acabamos criando uma nova espécie de vida, a do homo Erectus, pai e mãe do Homo Sapiens. O que já venceu milhares de outras pandemias.

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