Jung, meio século
–Apolinário Ternes
Revirar baús é próprio de gente vivida. É o que tenho feito ultimamente. Agora, achei carta de parente revelando fatos sobre a origem da família. Os Ternes, de Tijucas, aparentados com os Laus, vindos da Alemanha e da França, respectivamente. Achei, também, recorte da revista Visão de março de 1980, com entrevista de Jung, sob o título ‘viver é coisa que se aprende’. Visão reproduz entrevista dada por Jung em 1960 ao The Sunday Times. Revista, jornal e o próprio Jung, desaparecidos. Declarações feitas há 54 anos. Jung foi um intelectual atípico. Isto é, reservado, homem de grandes silêncios e viagens profundas. Estudioso da alma, rival de Freud, foi, acima de tudo, incansável leitor sobre as culturas antigas, primitivas ou não.
Nas páginas amarelas de Visão (nada se cria, tudo se copia) Jung recomenda a criação de escolas para adultos. Para que as pessoas, concluída a primeira etapa da vida, por volta dos 40 anos, pudessem se reciclar e se preparar para a segunda etapa. É preciso lembrar que suas palavras são de 1960, quando, aliás, o mundo estava de ponta-cabeça. Vivíamos a década da contestação, da desconstrução, dos hippies e do amor livre. Tudo o que hoje é normal, naquela época não era. Não existiam o celular, o Ipad e o Face, mas a comunicação estava em alta. O guru daqueles tempos era um canadense chamado McLhuan. O outro era Marcuse, intelectuais que tinham muito a dizer. Hoje, comunicadores são os rapazes do funk, do hip-hop, do pagode. Avançamos ou retrocedemos? Bem, continuamos na mesma condição dos homens de milhares de anos atrás, aprendizes do perigoso ofício da vida, é o que diz Jung, com simplicidade.
Jung fala de religião, da necessidade da fé e da instável humanidade de todos nós, obcecados com a segurança e ansiosos consumidores de felicidade. De fato, ‘viver é coisa que se aprende’, pena que o aprendizado, para a maioria, signifique a vida quase toda. Senão mais. Deveríamos viver 200 anos. A primeira metade para aprender como não desperdiçar a segunda. É o que faremos no futuro, quando velhice volte a ser sinônimo de sabedoria, como na China de mil anos atrás.
Artigo para quarta, 4-06-14